quarta-feira, dezembro 20, 2006

O Congresso é a Geni?

Fábio Siqueira é professor e historiador
e-mail:
fabiogsiqueira@ig.com.br

Mais uma vez, desfruto da generosidade de meu amigo Roberto Moraes, para ocupar este seu prestigiado blog com algumas reflexões. Esta consideração preliminar se deve, a recente constatação em conversa com amigos que conhecem a mídia local, onde fiquei assustado com projeções sobre o pequeno número de leitores de jornais diários em Campos. Acho que, considerar a pequena proporção dos que se atêm a artigos e páginas de opinião, ajuda a entender um pouco o quadro sócio-político local. Por isso, é bom ter acesso à interlocução com um público qualificado e crítico, na expectativa de atrair a atenção de pelo menos parte dele. Estou tomando gosto pela coisa, é uma “cachaça” como diz nosso blogueiro.

Na “ordem do dia” a maior polêmica do momento: o aumento salarial dos membros do Congresso Nacional. Longe de mim, assalariado sem reajuste desde que tomei posse no serviço público – isso mesmo, o mesmo piso salarial há oito anos! – tomar a defesa de nosso nobre colégio de líderes partidários, responsável pela decisão. Mas, quem atira as pedras?

Escrevo no dia em que o Exmo. – ou seria Mmo. – colegiado do STF decidiu sustar o polêmico aumento. A propósito, qual é mesmo o salário dos Ministros (as) do STF? Respondo: exatamente o mesmo, aliás, parâmetro para o valor aprovado pelos achincalhados parlamentares. Onde estava a severa opinião pública e sua vetusta tutora, a grande imprensa, quando os doutos magistrados da Corte Suprema concederam a si mesmos os nababescos salários? Alguém já experimentou a edificante experiência de assistir à relevante programação da TV Justiça? Vale conferir, sobretudo a performance do Exmo. Ministro Marco Aurélio Mello! Quem delegou a esta corte o poder de garantir para si o mesmo salário que julgam ilegal para outro poder? O povo?

E por falar em interesse popular, será que o Poder Judiciário atende melhor aos interesses da sociedade que o Poder Legislativo? Em que será que o Roberto Jefferson ou o Severino são piores que o Nicolau “Lalau” e o Rocha Mattos? Qual o destaque que a grande imprensa, grande guardiã do interesse da opinião pública, tem dado ao relevante debate sobre o controle externo do judiciário? E qual será o salário da Miriam Leitão – que, como noticiou este blog goza da grande admiração de Roberto Jefferson? Qual o aumento que a Globo concedeu a ela em sua data base? Será que o Alexandre Garcia era tão implacável com o Congresso na ditadura? Naquela época os deputados ganhavam menos ou ele era mais complacente?

Todas essas questões me fazem lembrar da canção Geni e o Zepelim, do mestre Chico Buarque. É inegável que, com grande inabilidade, a maioria dos Deputados federais e Senadores se submeteu a um desgaste imenso, agindo de maneira indefensável. Assemelham-se assim à heroína da canção, que não reivindica virtude porque obviamente não a possui. Destacam-se, porém, na obra de Chico os hipócritas personagens da “boa sociedade” que, igualados a Geni e, até mesmo salvos por ela, não hesitam em atirar-lhe pedras no dia seguinte.

Gostei muito de uma imagem que o Franklin Martins relacionou à “opinião pública” em recente artigo sobre esse mesmo tema. Esta seria uma senhora viúva, de boa índole, mas preconceituosa, moralista e um tanto ignorante, sujeita, portanto, a juízos de valor simplistas e equivocados. Seria oportuno que esta típica senhora de classe média se lembrasse que toda sociedade é responsável pela ELEIÇÃO do Congresso Nacional. Seus membros, independentemente de erros e acertos, representam os cidadãos. Suas atitudes, mesmo as piores, refletem a sociedade em suas qualidades e defeitos, como se fossem o espelho da viúva em questão. Infelizmente, não podemos escolher, nem cassar ou punir os que ocupam redações e microfones dos jornalões e emissoras de TV, que formam “nossa” opinião, nem os bem pagos membros da Corte Suprema.

PS.: Apesar de tudo, otimista incorrigível, tenho boas expectativas para o ano novo que se avizinha. Despeço-me temporariamente dos poucos que resistiram a todas as linhas desse artigo – sei que preciso ser mais conciso, chego lá! – desejando boas festas e um feliz 2007.

quinta-feira, novembro 30, 2006

Nosso lema é sofrer, sofrer?

Fábio Siqueira
Historiador e professor
e-mail:
fabiogsiqueira@ig.com.br

Aqui estamos nós de novo nesse prestigiado blog e, mais uma vez, apesar de não ter a intenção de caracterizar a nossa participação como de articulista esportivo, sou instado pelas circunstâncias a iniciar este texto pelo apaixonante tema do futebol!

Como foi bonito ver nesse blog imagens da grande “vitória” que foi o empate arrancado pelo Goyta na Ilha do Governador no último sábado. Como foi bom, impossibilitado de acompanhar de perto tal feito, sentir nas ruas da cidade a intensa alegria de dezenas de torcedores alvi-anis logo após a “conquista”.

Mas, vem a velha sina de novo e quem diria – coisas do futebol – o antigo algoz é paradoxalmente lembrado como garantia da efetivação da conquista. Mas ele agora é saudade. É por isso que o futebol é tão apaixonante, e o livro do Roberto sucesso de antemão. Sobre futebol e literatura, um parêntese: está na minha lista de leituras um livro de um jornalista escocês cujo título Futebol e Guerra remete à invasão da Ucrânia pela Alemanha nazista nos anos 40, e que trata da saga do glorioso escrete do Dínamo de Kiev neste contexto, vale conferir.

Voltando a realidade do Goyta, o sofrimento me enseja antiga inquietação. Juro que não é ressentimento nem dor de cotovelo. Alguns interlocutores podem confirmar que já fiz, timidamente, este questionamento. Timidamente por saber que suscitaria grande polêmica mesmo reservadamente, como de fato se deu. Pois agora, no calor da paixão, lá vai: qual o papel do MP?

Conheço a resposta formal no cenário institucional brasileiro. Mas essa instituição sempre me preocupou. Não nego seu importante papel em momentos marcantes na história recente do Brasil. Reconheço que têm funcionado como fator de maturidade da democracia brasileira. Mas há, a meu juízo, uma gama grande e imprecisa de atribuições relativas ao MP e uma necessidade de tornar a informação sobre as funções e o funcionamento desta instituição mais acessível aos cidadãos. Além disso, com todo o respeito, o comportamento de alguns procuradores se assemelha ao de um pavão!

Essa mistura de personalismo e concentração de poder, não é à toa que o MP é chamado de Quarto Poder, pode ter sido benéfica em alguns momentos, mas me parece perigosa. Sei o tamanho da provocação que faço aqui mas, não consigo conceber que não haja no contexto sócio-político do RJ algum problema mais relevante que a seletiva para atrair a atenção do MP!

Como conseqüência dessa concentração de poder do MP e da Vênus platinada, estamos nós, de novo, vendo escapar pelos dedos o acesso do Goyta à primeira divisão. Apesar da licença poética no título, no campo de jogo fizemos valer o nosso glorioso hino: VENCEMOS! Quanto aos próximos capítulos desta “novela”, com desfecho previsto para 2008, já serão material para que nosso blogueiro comece a pensar em um segundo volume.

segunda-feira, novembro 13, 2006

Altruísmo, malas e pãezinhos

Fábio Siqueira
Historiador e professor
Sei que este prestigiado blog só tem tido espaço, no que se refere a futebol, para destacar a heróica campanha do Goyta na seletiva em disputa. Mas como o último sucesso frente o Villa Rio já foi suficientemente comemorado e comentado por aqui, não resisto a provocar a discussão sobre o que se passa com o Flamengo – paixão que também compartilho com o blogueiro. Como explicar esta derrota para a Ponte Preta? Creio que não se trata apenas de acomodação por estarmos livres do rebaixamento e classificados para a Libertadores - o que, convenhamos, é mais do que poderíamos esperar considerando as últimas temporadas e o início do ano.

Não sei se andam se inspirando em Robin Hood lá pela Gávea, pois os bons resultado contra times que disputam posições entre os dez primeiros colocados como o "Furacão", o Goiás e o Paraná são alternados com outros frustrantes como o modesto empate com o rebaixado Santa Cruz e a derrota para a "Macaca", que está com o pé na cova.

Confesso contudo, que após a terceira repetição da cobrança de penâlti inexistente, marcado aos 47 minutos do primeiro tempo, com direito a mudança de batedor após a segunda defesa do Bruno, me lembrei imediatamente de animado papo que entabulei esta semana sobre “causos” e traquinagens envolvendo o famoso “homem da mala”, figura que costuma “motivar” árbitros a serem compreensivos com times da casa. Há inclusive um “causo” em que, em situação idêntica a aqui citada, o juiz teria exigido a troca do batedor após a segunda cobrança!

Só espero que o espírito "altruísta" do Mengo não contagie o Goyta na quarta, diante do moribundo Duque de Caxias!

Mais estapafúrdia que a derrota do Flamengo, só mesmo a polêmica envolvendo o pãozinho francês! Será que dá para algum especialista em pesos e medidas manifestar-se de forma clara provando que é IMPOSSÍVEL que a situação atual seja prejudicial ao consumidor? Os pretensos lesados devem atentar para o fato de que eram tungados antes, quando compravam pãezinhos de "50 g" que deviam pesar 40g ou menos. Agora, a mercadoria vale quanto pesa!

Criar polêmica sobre possíveis efeitos negativos da lei que determinou a venda a peso só interessa ao velho demagogo que, ainda atordoado pela acachapante derrota nas urnas busca um factóide com apelo popular para melhorar sua imagem. Os verdadeiros liberais teriam uma sugestão melhor para os consumidores insatisfeitos: que tal pesquisar as padarias em busca do melhor preço (Kg)? Como diria o antigo bordão: "É a ingnorância que astravanca o progresso!"

sexta-feira, setembro 01, 2006

“Quem matou o jornal?”

24 Aug 24th 2006From The Economist print edition

“O negócio de vender palavras aos leitores e de vender leitores aos publicitários, que sustentou seu papel na sociedade, está caindo...

... De todos os meios “velhos”, os jornais é o que tem mais a perder com a internet. A circulação tem caído na América, na Europa Ocidental, na América Latina, na Austrália, na Nova Zelândia por décadas (em outra parte, as vendas se estão subindo), mas, no futuro, em poucos anos, todos estarão em declínio. Em seu livro “o jornal desaparecendo”, Philip Meyer calcula que no início de 2043 será o momento em que o jornal impresso morrerá na América, quando o último leitor esgotado, jogará de lado a última edição... As pessoas mais novas estão começando a ler notícias na rede. Britânicos entre 15 e 24 dizem que gastam quase 30% menos tempo lendo os jornais nacionais pela web".

Quanto a publicidade
"A internet é um meio sedutor que combina supostos compradores com os vendedores e prova aos publicitários que seu dinheiro está bem gasto. Os anúncios classificados estão se deslocando rapidamente para a rede".

O cenário
"Os jornais ainda não começaram a fechar para baixo em números grandes, mas é somente uma questão de tempo. Em 2005 um grupo dos acionistas do Knight Ridder, proprietário de diversos diários americanos grandes, começou a vender seus papéis e terminar assim uma história de 114 anos. Este ano Morgan Stanley, um banco de investimento, pressionou o New York Times, a maior empresa jornalística, porque seu preço de capa tinha caído nos últimos quatro anos.

A fim cortar custos, já estão gastando menos com o jornalismo. Muitos estão tentando também atrair uns leitores mais novos deslocando a mistura de suas histórias para o entretenimento, o estilo de vida, e outros assuntos que podem parecer mais relevantes às vidas diárias das pessoas, do que com os casos internacionais e de política. Estão tentando criar uma linha negócios novos. E investindo nos papéis diários livres, que não se usam além de alguns recursos editoriais para descobrir corrupção política ou fraudes".

Os grandes
"As publicações como os New York e o Wall Street Journal devem aumentar seus preços para compensar os rendimentos com os anúncios perdidos para a internet. A utilidade da imprensa vai muito mais além dos abusos investigados ou de divulgar a notícia apurada. Ela pode prender governos ou pressioná-los a se explicar para a opinião pública. A internet expandiu esta possibilidade. Qualquer um que procura a informação nunca esteve tão bem equipado. Os povos já não têm que confiar em um punhado de jornais nacionais ou, pior, em jornais da sua cidade. Os noticiários locais do Google extraem notícias de todo o mundo. O web site do Guardian da Grâ Bretanha tem quase a metade de seus leitores na suas casas na América".
Os blogs
"Além disso, uma força nova dos jornalistas e dos blogueiros vinculam o “cidadão” e os políticos ao cliente da notícia. A rede abriu o mundo fechado dos editores e repórteres profissionais a qualquer um com um teclado e uma conexão da Internet. Diversas companhias estão trocando e depurando os “postings” que saem dos laptops ou TVs à cabo de amadores adormecidos no sofá.
Cada blogueiro é capaz de polarizar e caluniar, mas, feito um exame enquanto grupo, os blogueiros oferecem a pesquisa e a filtragem de matérias numa imensidão de informações entregando-as mastigadas à rede. Naturalmente, a internet é uma alcova às mentes fechadas, mas, de qualquer forma, exerce muita da pressão".
Um novo modelo
"A maioria dos blogueiros operam das suas poltronas, não na linha de frente (no front), e os cidadãos-jornalistas tendem a furar as matérias locais. Mas, tudo é ainda muito novo. Os novos modelos saltarão na frente como conseqüência do recuo dos papéis. Um grupo não empresarial tenta implantar modelos que combinam o trabalho dos amadores e dos profissionais para produzir histórias investigativas pela internet. Apropriadamente, US $10 mil de dinheiro para o projeto vieram de Craig Newmark, de Craigslist, um grupo de Web site livres da “classific-propaganda” que provavelmente, fizeram mais do que, qualquer coisa para destruir a renda dos jornais.

No futuro, segundo Carnegie, algum jornalismo de alta qualidade será suportado também por organizações não empresarias (non-profit). Já, há algumas organizações respeitadas de notícia que se sustentam, desta forma e nela se incluem o Guardian, o monitor da ciência Christian e a Rádio Pública Nacional.

Um grupo de elite do jornalismo sério dos jornais está disponível e é sustentado, de forma independente, por milhares de blogueiros voluntários que ateiam fogo junto com os cidadão-jornalistas bem informados em toda parte da rede”.

PS.: Texto traduzido e editado de matéria do famoso jornal "The Economist".

sexta-feira, agosto 11, 2006

Qual é a direção do Plano Diretor?!

Luiz Felipe Muniz de Souza
Advogado e ecologista
Campos, 06/08/2006.

Se depender do empenho de Silvana Castro e Sidney Salgado (Secretaria de Planejamento e de Meio Ambiente) o Plano Diretor de Campos vai acontecer. Não temos ainda uma visão clara dos níveis de excelência que alcançaremos com a metodologia adotada, mas de qualquer forma algo vai sair.

Confesso ter dúvidas quanto as consultas feitas às comunidades distritais, na minha opinião, de certa forma, prematuras. Faz tempo que nossas comunidades perderam as suas características culturais e visões orgânicas; as poucas lideranças foram cooptadas pelos perversos movimentos políticos-partidários dos últimos anos. Não creio que saibam exatamente o que querem nos quesitos qualidade de vida urbana, rural, sustentabilidade, mobilidade e planejamento participativo. Há um enorme vácuo a ser preenchido pelo poder público e pela mídia regional no sentido de melhor instrumentalizar a todos para que opinem minimamente na direção das perspectivas do Estatuto da Cidade (Lei Federal 10.257/2001) e da Agenda 21 Local.

Como se não bastassem algumas dúvidas com o método adotado pela Secretaria de Planejamento e de Meio Ambiente, o prefeito Alexandre Mocaiber dá sinais de que outros grupos dentro de sua administração também estão mobilizados no mesmo sentido do Plano Diretor, ou seja, de pensar a cidade e o seu futuro. Acaba de lançar publicamente o “Perfil 2005 de Campos dos Goytacazes” objetivando “atrair investidores para diversificação” da economia do município. Pode não parecer nada demais! De fato é muito bom saber que há outros trabalhos para somar na tarefa da organização municipal, mas pelo nível de detalhamento do perfil e intenções reveladas, podemos afirmar que esta obra não pode ter vida própria, deve agora migrar para as comissões que estão de fato tentando fazer parir um Plano Diretor comprometido com a Sustentabilidade dos Processos Urbanos e Rurais de nosso município.

Nos próximos dias será a vez da FIRJAN. Segundo o Geraldo Coutinho, a Federação de Indústria apresentará publicamente uma proposta ou um plano de metas de desenvolvimento para todo o Estado do Rio de Janeiro, inclusive para Campos. Ótimo, de fato há enorme carência de propostas inovadoras e metas a serem compridas com objetividade e responsabilidade, por parte do Poder Público Estadual e Municipal. Entretanto, nunca é demais relembrar que não podemos mais permitir que os erros do passado ocupem espaços no atual momento de crises sócio-ambientais fartamente reconhecidas pelas instituições governamentais, acadêmicas e não-governamentais.

É preciso que antes de tudo todos nos convençamos de que para arrumar a bagunça, devemos começar pelo dever de casa, que hoje é a elaboração madura de nosso Plano Diretor com o devido Zoneamento Ecológico-Econômico-Social, garantindo previamente aonde podemos ou não podemos modificar, construir, instalar industrias, novas culturas agrícolas e aonde é urgente mobilizar para recuperar, reflorestar, criar Parques Municipais para lazer e estudo, etc.

Temos que reconhecer que não é nada fácil dar conta desta tarefa hercúlea e tardia, porém, se o prefeito Alexandre Mocaiber não investir fortemente no sentido de garantir melhor entrelaçamento e comprometimento entre os diversos atores públicos, corremos o risco de mais uma vez ver nossas energias arremessadas no ralo, fazendo de todo o esforço comunitário um amontoado de textos e papéis que depois não serão acolhidos pela Câmara dos Vereadores, nem serão ganho algum em tempos de urgências; tão somente servirão para enriquecer as prateleiras dos pesquisadores de plantão e críticos de toda a ordem.

quarta-feira, abril 26, 2006

Cinema, pedagogia e complexidade quântica!

Luiz Felipe Muniz de Souza
Advogado, psicopedagogo, ecologista, educador, industriário.
Campos, 25/04/2006

Quando no final dos anos 80 e início dos anos 90 tive os primeiros contatos com as obras de Fritjof Capra – “O Tao da Física” e o “Ponto de Mutação” –, senti-me atônito e meio que embriagado com tantas abordagens incomuns e surpreendentes sobre os princípios da física e da mecânica quântica, relatados de forma brilhante por aquele autor. Naquela ocasião, lembro-me bem, muitos operadores, da dita “opinião pública”, taxavam as obras como uma fantástica aventura “new age” de um físico mal sucedido que resolveu conhecer os mistérios da Índia. Contudo, mesmo assim, não impediram que se tornassem “best sellers”, e, que o autor continuasse a produzir obras magníficas como: “A Teia da Vida” e “As Conexões Ocultas”.

Eu, que me encontrava bacharelando em Direito na Faculdade de Direito de Campos e ao mesmo tempo aperfeiçoando um perfil estritamente técnico na área de inspeção de equipamentos e instalações junto a Petrobras, vi-me retorcido numa espetacular quebra paradigmática profunda e solitária, ainda maior na medida em que ia percebendo em mim mesmo o modelo formatado nos poderosos preceitos da física newtoniana (clássica / mecanicista) e nas lógicas mais tradicionais do cristianismo católico.

A partir de então eu jamais parei de buscar nos livros os caminhos possíveis para o meu agora pleno desajuste pessoal, algo que somente hoje posso tentar classificar como: crise sócio-eco-psico-antropo-bio-histórico-cultural. Passei a devorar de tudo, da antropologia à cosmologia passando pela administração pública e privada, pelas terapias holísticas e a psicopedagogia, pelas ecologias rasa e profunda e mais recentemente pelos aceiros da complexidade, sempre flertando as costuras impensadas e pouco prováveis aos olhos vendados.

O Direito continua me fascinando, mas como ciência avança tímida e lentamente, vejo-o ainda como a morada infiel da complexidade quântica que atualmente urge, falta-lhe uma matriz ética universal de bases mais complexas e transdisciplinares. Ao mesmo tempo, sinto que há caminhos promissores se ocorrerem iniciativas rigorosas e inovadoras nos campos pedagógicos em todos os segmentos da sociedade atual, de tal forma que haja o gozo real das responsabilidades mútuas e coletivas a partir das opções pessoais que fazemos diuturnamente. Algo que imagino mais provável com a expansão atual e gradual da dimensão feminina nos seletos redutos machistas de poder!

Um exemplo do que tento colocar acima tive a satisfação de ver plasmado numa fita de longa metragem que assisti numa pequena sala de cinema em São Paulo, onde estive recentemente. O título do filme é sugestivo – “Quem somos nós?” –, distribuído pela Playarte e produzido por William Arntz, Betsy Chasse/2004. Inicialmente não fiz fé, no entanto, ao final estava em grande êxtase por ver-me diante de parte de meu próprio drama pessoal dos últimos 15 anos. Fiquei boquiaberto com a animação, o conteúdo e os protagonistas envolvidos – todos Phd’s em física, medicina e biologia – manifestando em viva voz suas experiências e convicções num convite sublime para uma nova visão da realidade humana e planetária a partir do que eles chamam de “a nova ciência: física quântica”.

Os modelos pedagógicos que predominam nos diversos cenários educacionais ainda não conseguiram incorporar saberes já consolidados para as reconstruções neurais e sócio-culturais urgentes, com isso, cada vez mais as escolas e universidades tradicionais se distanciam da realidade bruta, nua e crua! Seja em função dos limites de seus mestres em remodelar os seus egos ou em função dos gigantismos burocráticos e administrativos das instituições educacionais em tempos virtuais, ou, por ambos. O fato é que nem mesmo as grandes instituições empresariais estão aguardando o ajuste das escolas e universidades, elas, as empresas, estão criando as suas próprias universidades e com isso estabelecendo novas lógicas de apropriação do saber diante da voracidade global em tempo real.

Enfim, eu reafirmo o que acredita Edgar Morin sobre o enorme impacto pedagógico e educacional do cinema, ou seja, dos filmes para o nosso momento atual. O freio abrupto do frenesi diário, diante da tela e da celebração ao filme, opera nas mentes e nos espíritos atentos um espaço fértil para a semeadura dos dramas e das realidades cruéis sem a perda de foco e do prazer do novo, aspectos pouco comuns nos cenários das salas de aulas tradicionais. Parabéns aos idealizadores e agora condutores do Cine-Club de Campos dentro de uma faculdade, a de Medicina, não poderia ser mais apropriado! Fica aqui a minha sugestão para a programação: “Quem somos nós?”, não sem antes, é claro, uma introdução ao tema por meio da projeção do filme “Ponto de Mutação” baseado no livro de Fritjof Capra (de mesmo título) e dirigido por seu irmão, Berndt Capra/1991.

sexta-feira, março 31, 2006

Redes, carnaval e sustentabilidade ecológica

Luiz Felipe Muniz de Souza
Advogado, ecologista, terapeuta, psicopedagogo
lfmunizz@gmail.com
24/02/2006

Gostaria de falar sobre redes, não das redes de nossas varandas que nos convidam ao ócio e aos prazeres do sono após o almoço de verão. As redes que me refiro são aquelas das conexões possíveis, das comunicações inadiáveis e das estruturações virtuais e porque não dizer redes neurais de nosso tempo.

O problema é que em época de carnaval falar de redes parece fantasia e a fantasia nos remete aos sonhos infantis. Para o momento não caberá nem o discurso nem as idéias mirabolantes. Mas, veja bem, todos podemos fazer o mesmo discurso, muitos podem fazer o mesmo discurso, cada um de nós deve fazer o mesmo discurso, porém confesso, caros e caras, tem sido cada vez mais difícil para mim! Não consigo mais acolher com tranqüilidade os inumeráveis "belos" discursos que, de certa forma não se apropriam das mazelas históricas de nossa gente, uma gente sofrida e forjada pela violência vil dos europeus em fanfarra, encantados com o paraíso tropical detonaram os "selvagens", particularmente as selvagens de peles sedosas que tiveram seus úteros invadidos por genética incomum, mas tudo bem...(?)

Em seguida os negros dilacerados de seus lares fartos e arremessados como cães raivosos nas lavouras juvenis, fruto da devastação da exuberante mata de outrora que chamamos hoje de atlântica. Nem mesmo esta chaga de sangue e tortura foi capaz de aniquilar e ocultar o sorriso sempre estampado no rosto de cada brasileiro e brasileira.

Após 500 anos de dominação da direita, ou melhor, da visão burguesa de governo, da forma preconceituosa e hierárquica de exercer o poder na nação e de entender e acolher as diferentes culturas humanas - dividindo-as em classes para repartir desigualmente o pão de cada dia..., assistimos agora mais recentemente a entrada de outros no "palácio", boa parte de nós - os fartos - ficamos perplexos e em crise com as possibilidades de mudanças e desvendamentos, uma loucura que virou ícone nas palavras de Regina Duarte... Esta história ainda não terminou...!

Ah! Como aprecio hoje os muitos ensinamentos do Darci Ribeiro e outros grandes pensadores como Edgar Morin, Claude Lévi-Strauss, Domenico De Masi,... que tiram o Brasil como o celeiro e o útero de uma nova civilização, o elogio eloqüente à nossa tropicalidade, à nossa rica miscigenação, ao nosso desejo profundo por paz e por festas noite e dia, ao nosso enorme potencial acolhedor, ao nosso magnífico "jeitinho brasileiro" e brincalhão de levar as coisas para adiante - sinal maravilhoso de nossa enorme tolerância com o outro...

Infelizmente aquilo que alguns vêem como virtude de um povo, alguns outros importantes senhores e senhoras apenas se apropriam para detonar as nossas frágeis instituições e cutucar a nossa auto-estima nacional. Rebaixar a nossa moral coletiva é uma forma cruel de se fazer vedete e ao mesmo tempo campanha político-partidária contra o governo de ocasião, por isso que dizem que em época de copa do mundo tudo gira favorável ao governante instalado na alvorada ou nos demais castelos. A alegria contagia e desintoxica a alma, feliz é o povo que tem o futebol como cenário de luta por suas diferenças e convicções e um carnaval como o nosso para o deleite profundo da beleza e das paixões pela vida.

Ao mesmo tempo que a minha opinião possa gerar alguma suspeição por operar parte do meu tempo em uma empresa estatal de destaque, sei que talvez as minhas afirmativas facilite a vida afrouxando a alma de muitos que concordam e adotaram o silêncio ou a indiferença como instrumento de sobrevivência e desfaçatez.

O fato que classifico hoje como real e relevante é que o nosso carnaval é a expressão máxima de uma cultura humana multi-inter-transdisciplinar. Nós, povo brasileiro, conseguimos construir numa grande extensão territorial uma maneira única, maravilhosa e alegre de exibir a sagrada existência da vida humana através das festas de rua, dos bailes, dos blocos, das escolas de samba, dos frevos, dos maracatus, dos bois “pintadinhos” e de tantas expressões ainda não catalogadas. Infeliz o governante que cooptar esta magia na intenção descarada de autopromoção eleitoral!

O problema entonado continua por gerações e séculos o mesmo e não nos pertence propriamente, prezados leitores e leitoras, ele é da humanidade e de nosso tempo. Edgar Morin desnuda bem estes lençóis, estas dimensões - a crise humanitária atual - nas suas obras sobre o Método, particularmente no último livro sobre a ética, lá que encontrei algum conforto para as minhas mais abissais angústias. O gênero humano é capaz de discursos incomuns e belíssimos, músicas complexas e poesias transcendentais, tanto quanto o é para práticas levianas, perversas, egocêntricas e paradoxais.

A atenção que se exige hoje passa pelas redes, pela alegria e liberdade de nossos carnavais, mas somente poderá prosseguir dando algum sentido se soubermos canalizar estas energias rumo aos desafios e urgências da sustentabilidade ecológica.

Somente um povo como o nosso será capaz de inaugurar novos paradigmas estruturais e não será com uma visão reduzida de sustentabilidade que chegaremos lá. Os homens e mulheres dos planejamentos públicos de governo fazem uso sistemático deste termo, porém desconhecem os seus significados reais, iludem-nos com projetos ditos sustentáveis, quando na verdade são caóticos e obtusos, a pseudo-sustentabilidade é que rege a marcha desta engrenagem sem lubrificação.

A sustentabilidade desejada é aquela que acolhendo os ciclos naturais estabelece novos níveis de relacionamentos dos humanos com o mundo, com o outro e consigo mesmo. Nas palavras de Fritjof Capra: “Uma vez que a característica notável da biosfera consiste em sua habilidade para sustentar a vida, uma comunidade humana sustentável deve ser planejada de forma que, suas formas de vida, negócios, economia, estruturas físicas e tecnologias não venham a interferir com a habilidade inerente à Natureza ou à sustentação da vida".

sexta-feira, março 24, 2006

Calvário da democracia


Luiz Felipe Muniz de Souza
Advogado, ecologista, terapeuta, psicopedagogo
lfmunizz@gmail.com
23/03/2006

Nos últimos anos por aqui não temos feito outra coisa a não ser assistirmos a uma contínua ruína institucional, política e ambiental desta magnífica e outrora promissora região norte-fluminense.

Desde tempos atrás, quando a eletricidade nos brindou em primeiro lugar e nossos rios eram ricos em pescado e águas da melhor qualidade, que as decisões das instituições públicas não contrariam os interesses dos instalados no poder estatal, porém nada se compara com os dias de hoje.

Para nós, cidadãos e cidadãs campistas, os endinheirados pelo petróleo que jorra, não há licitação nem há obras, tudo por decreto e empreitada do rei da província, quem puder, quiser e não se satisfizer com o resultado do pleito, que entre com a popular. Aos milhões de reais os peões do legislativo se protegem como podem nas asas da rainha das 10.000 obras suspeitas. No jogo da política partidária não há xadrez só freguês!

Se antes as enganações não nos tolhiam as festas regionais originais e nem nos tornavam sonâmbulos sem sonhos, mesmo que famintos, hoje somos todos tragados e agredidos, querendo você ou não, por uma certa aberração falaciosa anti-ética e arrogante em praticamente todos os cenários e segmentos institucionais – educação, política, saúde, meio ambiente, justiça, etc – que partindo daqui chegou ao Estado, sem antes deixar pelo caminho suas sementes gloriosas, que como ervas brotaram em profusão jamais registrada na história recente deste município, quiçá deste Estado.

Agora no delicado tapete das convenções partidárias nacionais o vale-tudo não se pré-ocupa com as cortinas e véus, com as suas próprias mãos e palavras, paira no ar a convicção da vitória do que gritar primeiro e inflar as galerias e galeras desocupadas contra o paredão, aquele que separa a plebe berrante e numerosa, dos engravatados e polidos veteranos encastelados nas certezas e nas glórias de outrora.

O menino rapa tudo com habilidade fulminante e acumula para si a experiência de velhas raposas arrependidas, cria tormentas inesperadas, sai ileso e entra glorioso quando quiser, e, como náufrago bem treinado, exibe tom sinistro em riso debochado na direção do “superior tribunal”; vejam bem onde estamos chegando, ou será que já estávamos lá?!

A maioria de nós assiste, no incômodo de sua poltrona, o triunfo da crise e a ruína da política partidária, que hoje se pratica no Brasil e em particular em Campos dos Goytacazes. Não creio haver dúvidas com relação ao insucesso deste modelo perverso, mas tenho uma forte intuição de que antes do seu fim, todos seremos tentados e convocados – tardia e desesperadamente –, pela força da natureza, para evitar que o caos veloz se instale de vez por aqui e acolá. Será? Veremos!

terça-feira, março 07, 2006

A morte de Antônio “Panela”

Nelson Crespo

Antônio “Panela” já havia enganado a morte uma vez. Depois de sofrer um derrame cerebral, foi “desenganado” pelos médicos e após vários dias na UTI voltou para a vida, há mais de 10 anos atrás. Com as seqüelas do ocorrido, teve que assumir uma vida diferente, mais limitada, mas que não tiraram dele a simplicidade, a imensa capacidade de ser prestativo e a alegria de viver, muitas vezes embalada pelos “xaropinhos” que ele bebia no Iskina's Bar, um dos estabelecimentos para quem ele fazia pequenos serviços gerais e de banco ali no quarteirão da Alberto Torres antes da linha do trem, à cem metros da minha casa...

Antonio “Panela” era meu amigo. Me chamava de “professor” e ficava todo orgulhoso quando eu dizia que ele era uma das “glórias da Alberto Torres”. Aliás, ele era querido por todos que o conheciam e que freqüentam aquele pequeno núcleo de lojas da famosa avenida e que inclui uma grande filial do Super Bom. Numa sexta feira dia 10 deste mês de fevereiro, após uma retirada num banco para uma destas lojas a quem servia, às 15 horas, Antonio foi assassinado com um tiro de pistola por trás, na porta da sua casa e em frente ao supermercado, por dois homens que o haviam seguido numa moto, numa tentativa frustrada de assalto. O dinheiro ficou no bolso de “Panela”...

Quando a violência das ruas sai das manchetes dos jornais para a nossa vida, quando a “vítima” não e só uma foto na tela da TV e sim um conhecido ou amigo, mais do que a grande revolta que sentimos, ela nos obriga a pensar mais profundamente sobre essa tão falada, temida e discutida violência urbana.

Em relação a este tema, como a tantos outros, a esquerda e a direita adotam posições contrárias e até mesmo antagônicas. Adoto aqui os conceitos de esquerda e direita definidos por Bresser Pereira(1), que por sua vez seguiu os passos do grande intelectual italiano Norberto Bobbio, e ambos afirmam que continuam vivos e atuais esses conceitos, sem lugar para uma suposta visão centrista “desideologizada”.

A direita coloca a questão da ordem social acima de qualquer outra na sociedade e assim, os problemas da violência têm que ser tratados dentro do império das leis e de um rigor cada vez maior destas, pois só o cumprimento da lei traz o equilíbrio social. Penas mais duras, diminuição da idade para a maioridade, maior poder de repressão, “exército nas ruas” e finalmente a defesa da adoção da Pena de Morte como solução maior, num “mix” que trazem diversas outras características, acabam sendo a solução proposta. Me espantou nos dias posteriores a morte de Antônio a preocupação de amigos e pessoas do bairro querendo saber se “já pegaram os caras”, como se isto trouxesse Antonio de volta. No fundo é como se a solução fosse “olho por olho, dente por dente...”.

Já para esquerda em pelo menos dois tipos definidos por Bresser, a esquerda radical que defende como a grande solução uma “verdadeira revolução socialista” ou para a esquerda crítica, que não chega a essa posição, mas que se auto define como uma crítica feroz do capitalismo e das suas contradições e que diz que seu papel é esse mesmo, apontar os “desvios de conduta” e a exploração capitalista, pois dentro da ordem capitalista, ainda mais “neoliberal”, não há nada mais a fazer a não ser expor o ponto de vista e a “voz dos oprimidos...”

Bem essas esquerdas simplesmente dizem que a violência urbana é uma filha natural do capitalismo a nada pode ser feito a não ser lutar por uma revolução cada vez mais “estratosférica” ou ficar denunciando a injustiça do “sistema”. Ou seja, nada se pode fazer, novos Antônios “Panelas” inevitavelmente continuarão a morrer.

Sem esquecer que ainda existem as propostas populistas que misturam os dois lados, pois são sempre “salvadores da pátria” que tem a solução no “bolso da camisa”, quero defender aqui uma posição que há muito tomei nas minhas perspectivas políticas e que ficam cada dia mais claras para mim, embora eu vá melhor explicitá-las em artigo posterior.

Eu falo da postura da esquerda social-democrática que entende que somente através de políticas públicas competentes, honestas e baseadas na ética é que poderemos mudar esse quadro da violência e porque não dizer da própria realidade social do país.

Em uma frase: a esquerda democrática tem melhores condições e maior competência para gerir o capitalismo do que a direita, em qualquer das suas matizes, porque essa esquerda coloca a justiça social como mais importante que a própria lei mas é democrática para entender que essa justiça só será alcançada se for resultado da vontade da sociedade e portanto resultado natural do avanço da democracia, que é o único sistema que respeita o outro e administra as diferenças.

Assim, a violência não se resolve só com repressão, mas tem que existir uma política de repressão enquanto a crise social estiver tão alarmante. Mas isso se faz com a “polícia inteligente” que privilegiando a investigação e a pesquisa obteve excelentes resultados em Nova York. Tem que admitir e combater publicamente a banda podre que existe nas polícias civis e militares, ao mesmo em que se tem que aumentar salários, melhorar a qualificação profissional e assim por diante e não criar guardas municipais que são meros cabides de emprego.

Da mesma forma é muito cômodo ficar falando em uma nova ordem social quando a maioria das pessoas que assim falam, reclamam de fato dos impostos que pagam, mas não usam e nem sentem falta da ausência das políticas públicas e não sabem da necessidade concreta e real que milhares de excluídos necessitam e que não podem ser reduzidas a distribuição de sacolões que como dizia o poeta “ou lhe mata de vergonha ou vicia o cidadão”.

É preciso publicisar o Estado brasileiro, fazer que ele chegue de fato a quem precisa. Ser de esquerda no Brasil é entender que o serviço público não chega a quem precisa e mudar isso, combater a plutocracia, o patrimonialismo, os diversos interesses corporativos que ficam com a maior parte do dinheiro público entre si e que é ser verdadeiramente revolucionário, ou melhor, aquele que é seu melhor nome e definição, é ser verdadeiramente democrático. Não é possível pensar que Antonio “Panela” morreu porque ainda não existe pena de morte ou porque o socialismo ainda não chegou. Hora, faça-me o favor....

(1)PEREIRA, Luis Carlos Bresser, O Paradoxo da Esquerda no Brasil, www.acessa.com/gramsci, Novembro de 2005.

Reflexões de um passeio à praia

Robson Santos Dias

Durante as férias universitárias, vinha aproveitando os momentos de folga para ir à praia dos Cavaleiros em Macaé. Geralmente eu ia até a praia de bicicleta passando pela Linha Verde, via expressa que passa por fora da cidade. Em um desses meus agradáveis passeios uma coisa me chamou a atenção. Um loteamento recentemente lançado no mercado imobiliário (não tem mais do que dois anos) já estava com toda infra-estrutura montada. Ruas asfaltadas, iluminação pública instalada, lotes demarcados, esgoto e distribuição de água instalados. Até aí tudo bem, a incorporadora construiu toda infra-estrutura, algo muito normal. Mas o que me impressionou foi o fato de que já existe um número considerável de casas de classe média alta quase prontas para morar. Não me lembrava de vê-las algumas semanas antes.

Lembrei-me de um outro momento, em meados do ano de 2005, visitei uma localidade pobre – o bairro Malvinas – que em tempos anteriores eu costumava ir semanalmente e também levei um susto ao constatar a existência de novas localidades carentes, cuja presença do poder público é praticamente inexistente. O mais impressionante é que essas novas localidades interligaram o bairro Malvinas com o bairro Nova Holanda, os dois principais bairros de baixa renda de Macaé, que, se seguirmos as ruas da cidade legal, possuem uma distância considerável um do outro. A população pobre conseguiu encurtar a distância entre os dois bairros ocupando áreas sem nenhuma infra-estrutura.

A minha surpresa talvez seja uma prova da minha distração, mas tenho certeza que os fatos supracitados surpreenderam muitas pessoas além de mim. Isto acontece porque o atual período de pujança econômica engendrou uma forte dinâmica demográfica que é por natureza dual. Esta dinâmica é impulsionada tanto por aqueles que trabalham no setor moderno da economia local, quanto por aqueles que não conseguem se inserir neste setor e vão para a informalidade. O espaço urbano macaense expõe de forma eloqüente esta dualidade.

Mas, como sabemos, o problema não é único em Macaé ou na sua região de entorno, apesar disso não nos abster de nossa responsabilidade com os mais desfavorecidos. O problema se reproduz, em maior ou menor grau, em cada cidade do país. O caso de Macaé é paradigmático por se tratar de uma cidade cada vez mais modernizada e globalizada, mas cujas contradições refletem o caráter conservador da modernização no Brasil.

A retórica do desenvolvimento exógeno presente nos defensores da refinaria não considera e nem nunca considerará esta questão. O que fazer com aqueles que não são aptos para a moderna economia? É preciso pensar em estratégias que possam dar a esta população o “direito à cidade”, mesmo se não incluídos na moderna economia globalizada.

Creio que não precisamos de idéias esdrúxulas, mas de revalorizar atividades tradicionais ignoradas pela economia formal. Criar oportunidades de vivência digna a partir de suas próprias atividades, de soluções endógenas, não necessariamente ligadas ao setor moderno da economia, pois este tem se mostrado cada vez mais excludente e o que precisamos em nossa sociedade é justamente aquilo que o setor moderno não faz, incluir.

segunda-feira, fevereiro 20, 2006

China – Um canteiro de obras

“A economia e a administração do mundo terão que ser reavaliadas”
(José Roberto de Oliveira)

Davos se encerra com o resumo, nada surpreendente de que a China ocupa a 4ª colocação na Economia Global e com uma poupança que já ultrapassa US$ 1 trilhão. Se isto fosse uma previsão, há 15 anos seria motivo de riso, pois, até então os doutores de Harvard, Princeton e outras universidades conceituadas em economia e administração diziam que:

1 - A economia chinesa não sobreviveria com a paridade cambial fixa yuan/dólar;
2 - Que os organismos internacionais pressionariam para condições mais humanas de trabalho e menos agressivas ao meio ambiente;
3 - Que a economia chinesa estava sentada em um saco de títulos podres, que assim que resgatados haveria um colapso bancário.

Nada disso se concretizou. Houve sim uma migração de capital de empresas americanas, européias e de outros países da própria Ásia para lá.

Um almoço e uma tarde de bate-papo com um amigo, ex-colega de “república”, que hoje trabalha com validação, ramo cada dia mais crescente na Economia globalizada, e recém chegado da China, que me conta o encanto de um país que está se adequando a um novo tempo e que apesar da ditadura econômica, todos estão conscientes de que é uma nova China e diferente do capitalismo do resto do mundo.

O meu amigo foi verificar as condições de fabricação de uma empresa de equipamentos que vende com 1/3 do preço do mesmo equipamento fabricado na Suíça com idêntica qualidade. Ele também constatou que há bom relacionamento entre diretores, gerentes e operários e não ouviu de nenhum deles qualquer crítica quanto à condução da economia.

De outro lado, questionou o uso da mão-de-obra infantil e obteve como resposta a de que por lá, pelo menos, eles não ficam como pedintes nos sinais.

Há três fatores, completa ele, para o sucesso chinês: capacitação, sistema tributário simples e escala de produção. A capacitação é algo obvio, pois, nenhum país migrou para uma economia com mais distribuição de renda sem educação. O sistema tributário mais simples reduz a corrupção e a sonegação, além de haver uma fiscalização maior da população na utilização dos impostos. Com capacitação e menos tributos, diminuem os preços dos artigos consequentemente há mais mercado e havendo mais mercado, há mais escala e então mais empregos.

Cidades médias na China têm de 4 a 6 milhões de pessoas. Nos últimos cinco anos, 350 milhões de pessoas migraram do campo para as cidades (quase dois Brasis). Esta massa tem que ser alimentada e aquecida num inverno de –35ºC e ter ocupação.

O desencanto do meu amigo com o Brasil ou o encantamento com a China é tão grande que está aprendendo chinês e mandarim e até arrumou uma namorada. Com todo o ritual de apresentação da família pretende se casar. Já ia me esquecendo, a China vive todo este crescimento sem perder o respeito à sua cultura milenar.

Ronaldo Araujo

Vencerá o pior...

Luiz Felipe Muniz de Souza
Ambientalista, bacharel em direito e petroleiro.
lfmunizz@gmail.com
Campos, 14/02/2006.

Não é pessimismo, é puro realismo! Enquanto grande parte da imprensa internacional e nacional não consegue barrar os destaques jornalísticos e científicos a respeito dos estonteantes temas que tentam dar conta diuturnamente da grave crise sócio-ecossistêmica planetária – o que vem exigindo das lideranças mundiais e regionais posturas mais ousadas e vanguardistas para as urgentes mudanças do modelo de desenvolvimento –, por aqui a colonização bárbara dos senhores de engenho e os inflamados egos desvirtuantes, ainda entonam os cânticos dos postulantes ao poder, sem idéias nem perspectivas, apenas com o regozijo viciante das turbas populistas, conseguindo apenas fazer surgir lideranças com os seus aguçados olhares provincianos rumo aos cofres públicos hoje repletos de Petrodólares.

Lá fora, o ano de 2005 acaba de ser anunciado por cientistas da Nasa como o ano mais quente da história e o início de 2006 está marcado definitivamente por um inverno na Europa, na América do Norte e em parte da Ásia com as temperaturas mais baixas dos últimos tempos (até -47ºC), incluindo nevascas intensas jamais vistas, um caos de proporções gigantescas para os grandes centros urbanos e para a maioria das comunidades que vivem às margens das conquistas tecnológicas e sociais, sinais de que o clima atônito ronda a nossa casa.

Em recente entrevista a revista “Veja” o demógrafo Paul Ehrlich – da Universidade de Stanfort da Califórnia – afirma que “a falta de comida causará a morte de milhões de pessoas nas próximas décadas” e traça um prognóstico perverso quando se refere a entrada da China e da Índia na perspectiva capitalista ocidental de economia de mercado, ponderando que “a chegada de bilhões de chineses e indianos a esse mesmo nível de consumo levará a conseqüências devastadoras para o meio ambiente e para a qualidade de vida na Terra.”, ressaltando que o planeta somente teria condições de sustentar hoje a presença de 2 bilhões de habitantes com o atual padrão ocidental, enquanto já somos cerca de 6,5 bilhões de seres humanos.

Na semana passada Tony Blair, primeiro ministro inglês, escreveu na introdução de um relatório oficial sobre o aquecimento global que “é evidente que a emissão de gases, associada ao crescimento industrial e econômico da população mundial, que aumentou seis vezes nos últimos 200 anos, está aquecendo a Terra numa velocidade insustentável”.

Ao mesmo tempo a ONU anuncia em Nova York que “a desertificação ameaça 2 bilhões de pessoas no mundo”, declarando 2006 como o “Ano Internacional da Desertificação” na expectativa de unir esforços para o debate e ações proeminentes em prol da proteção da biodiversidade planetária e combate as práticas humanas que sistematicamente tem transformado áreas férteis em desertos potenciais em todos os ecossistemas, particularmente nos trópicos. Segundo o geofísico da USP, Paulo Artaxo Netto, com a velocidade da mudança climática associada a contínua ação humana predatória, é razoável imaginar que “daqui a trinta ou quarenta anos, a região central do Brasil poderá estar tão seca que talvez não seja mais possível cultivar soja em seu solo”.

Já o autor Jared Diamond, ganhador do “Prêmio Pulitzer” de literatura, biogeógrafo norte-americano e professor da Universidade da Califórnia, acaba de lançar o livro: “COLAPSO - Como as sociedades escolhem o fracasso ou o sucesso”, sendo destacado por Merval Pereira, colunista do jornal “O Globo”, em recente publicação (02/02/2006), como o livro que hoje tem orientado alguns palestrantes e profissionais da área de economia e planejamento. Diamond sustenta que “os Estados Unidos são hoje como a Roma antiga às vésperas do colapso: até capaz de perceber os sinais de alerta, mas incapaz de fazer os sacrifícios (como redução do padrão de vida) para reverter esse quadro”; traz em sua obra inumeráveis exemplos de sucesso e fracasso civilizacional e alerta que o seu trabalho é hoje em função de “nossa incapacidade de pensar no longo prazo e, principalmente, de nossa curtíssima memória”.

Dentre as tantas manifestações recentes a que mais chama atenção é a do professor James Lovelock, um dos mais respeitados cientistas ambientais da atualidade, num artigo especial de lançamento de seu último livro: “A Vingança de Gaia”, para o jornal inglês “Independent”, quando choca a todos os segmentos com um texto direto e contundente sobre o atual quadro de saúde da Terra. Ele afirma que “precisamos ter em mente a velocidade espantosa da mudança e nos dar conta do quão pouco tempo resta para agir” e que não há como mais barrar o processo da “mudança ambiental”, segundo Lovelock “cada comunidade e nação precisará usar da melhor forma os recursos que tem para sustentar a civilização o máximo que puderem.” Ainda, segundo ele: “o pior vai acontecer, e os sobreviventes terão que se adaptar a um clima infernal”.

...Mas...O que ou quem será o pior?

segunda-feira, fevereiro 06, 2006

Por um pensar e agir regional*

*Robson Santos Dias
Licenciado em Geografia
Bolsista de Iniciação Científica CNPq do NEED / CEFET-Campos

No atual estágio do sistema capitalista, o globalitarismo tem forçado as escalas locais a se adaptarem às demandas de um mercado cada vez mais competitivo e contingente. Os temas do desenvolvimento local, em uma perspectiva mais localizada e do desenvolvimento regional, numa ampliação não muito definida do desenvolvimento local, têm feito parte da maioria, para não dizer todos, os debates e encontros científicos das ciências que se preocupam com o desenvolvimento econômico e social.
Seguindo a tendência mundial, os debates, encontros e trabalhos científicos sobre a problemática da Região Norte Fluminense têm discutido de maneira bastante pertinente e profícua a questão do desenvolvimento regional. Questões sobre como diversificar a economia regional, como melhor utilizar os recursos dos royalties, a problemática urbana e, mais recentemente, sobre a vinda da refinaria dominam as rodadas científicas e as ações políticas.
Mas na minha curtíssima carreira acadêmica e científica, tenho observado uma contradição no pensar e no agir pela região. O discurso é sempre o desenvolvimento regional, mas quando fomos ver o que de fato é pensado (com algumas raras exceções) e feito em termos de política são ações fragmentárias. No campo intelectual isso pode ser facilmente resolvido, mas no campo da ação política o problema é muito mais complicado.
Existem duas ações que podemos classificar como explicitamente regionalista, visando o interesse das elites políticas e econômicas regionais, e nenhuma, pelo menos que eu tenha identificado, de desenvolvimento regional. A primeira ação regionalista foi a criação da OMPETRO para a defesa do atual regime de repasse de royalties, uma vez que este “direito” tem sido questionado por grupos políticos de outras partes do país. É de interesse comum que os municípios costeiros do Norte Fluminense e da Baixada Litorânea mantenham suas receitas privilegiadas, tendo como discurso a extração de uma riqueza que pertence a este municípios. É questionável pois nenhum município da região produz petróleo. Apenas os municípios de Macaé, Rio das Ostras, Carapebus, Quissamã e Campos dos Goytacazes, cujos territórios foram impactados pela infra-estrutura física da Petrobras, podem reivindicar alguma coisa. Fora estes, mais ninguém tem algum argumento consistente. A segunda ação regionalista é a recente coalizão pela refinaria do Norte Fluminense, sob pretexto de que este investimento alavancaria o desenvolvimento da região. Não era este o discurso na época que a Petrobras veio para a região? Se com a Petrobrás a economia regional não foi alavancada, é difícil de acreditar que a refinaria será melhor sucedida. Quanto ao regionalismo, é importante notar que as tradicionais rivalidades municipais foram deixadas de lado em benefício de um suposto desenvolvimento da região “historicamente injustiçada”.
O problema é que este regionalismo é uma forma de reificar a fragmentação da ação política. Tanto no caso da defesa dos royalties quanto na luta pela refinaria as elites políticas e econômicas municipais tentam reforçar seus privilégios políticos e econômicos em seus municípios. É de interesse destas elites a manutenção dos privilégios dos royalties, pois estes servem como instrumentos de perpetuação de seus interesses de classe. A existência de recursos abundantes, além do uso ilícito, permite o escamoteamento de sua incompetência de criar perspectivas reais de desenvolvimento econômicos e sociais utilizando-se dos recursos em “políticas de enfeite” dando a impressão de abundância e desenvolvimento. No tocante à refinaria, o debate político continua a esconder os interesses fragmentários e elitistas das classes políticas da região. A região precisa da refinaria porque há o risco de esvaziamento quando a produção petrolífera entrar em declínio. Por que tanta necessidade de uma solução exógena, se o atual período é dos mais favoráveis para o investimento na diversificação da economia? Mais uma tentativa de disfarce da incompetência das elites regionais na promoção do desenvolvimento auto-sustentado.
Na maioria das regiões mais bem sucedidas do Brasil, observa-se que a formação de enclaves isolados de desenvolvimento econômico são caso isolados e contraditórios. O desenvolvimento precisa ser territorialmente contíguo, indo além da escala local, abarcando a escala regional. Destarte, para a promoção do desenvolvimento regional do Norte Fluminense é necessário a promoção de desenvolvimento econômico e social dos municípios polarizados por Macaé e Campos dos Goytacazes. Dividir o bolo, buscando sempre ir além das pretensões regionalistas, incorporando os municípios da Baixada Litorânea que têm a vantagem de manter relações tanto com o Norte Fluminense quanto com a Região Metropolitana. O Noroeste Fluminense precisa também ser incluído e, se possível a Região Serrana. É preciso criar mecanismo menos concentradores de desenvolvimento.
Tudo isto é muito bonito, mas é utópico, um cético pode questionar. Concordo plenamente. Mas o que é a utopia senão um sonho passível de ser realizado? Creio que com vontade e ética política (que anda em falta hoje em dia) tudo é possível. Nenhuma mudança é feita com variáveis simples de resolver.

quarta-feira, janeiro 25, 2006

Que no final a Justiça vença!

Nelson Crespo*

Começo aqui minha colaboração com o Blog do Roberto Moraes, meu colega de CEFET e de tantas lutas ao longo de mais de mais de 20 anos! (desde os tempos do PMDB jovem!) falando sobre um assunto que parece estar encaminhando para a sua solução final, mas que no meu entender o desfecho está longe de agradar a maioria do povo campista: eu falo da anulação e das novas eleições para prefeito de Campos dos Goytacazes.

Quero fazer uma análise aqui defendendo que a decisão final pode ser até legal, mas ser for a atual a justiça não terá sido feita. Separo aqui, para horror de alguns juristas e muitos positivistas o conceito de Lei e Justiça, mas esse é assunto pra outra discussão...

Quando iniciou-se o processo eleitoral em 2004, as pesquisas eleitorais indicavam a vantagem para o candidato Paulo Feijó, que pretendia ser oposição ao grupo político que dominava o cenário municipal desde 1988, mas que pela primeira vez encontrava-se claramente rachado entre duas candidaturas que representavam lideranças com força política real no município (pois houveram outras dissidências mas estas eram “ pulverizadas” pelo líder maior e o grupo se apresentava unido na hora das eleições municipais).

Uma claramente identificada com o governo estadual, e desde o início com indícios de uso da “maquina política” do governo do casal Garotinho, e a outra representada pela candidatura de Carlos Alberto Campista (mais um “desafeto” de Garotinho) mas, que, embora assumisse claramente na sua campanha a condição de candidato da situação - (e portanto contanto com a “máquina política” municipal) tanto que um dos seus “slogans” era “Campista é Arnaldo de novo!”- diversas fontes confirmavam que ele não seria um candidato “puro sangue” do grupo político do prefeito Arnaldo.

Este, abalado por diversas denúncias e até condenações iniciais por improbidade administrativa, havia optado por um candidato de perfil mais transparente para negociar a sua situação num possível segundo turno entre as candidaturas favoritas na época, então Feijó e Geraldo Pudim.

Ocorre que, por erros administrativos em sua própria campanha e atrapalhado pelo crescimento da candidatura do PT, cuja maioria recusara formar uma frente contra o grupo político até então dominante, a candidato Feijó foi perdendo terreno e na reta final, onde as “máquinas políticas” estadual e municipal não pouparam a população de um espetáculo tristemente deprimente de “compra de votos” que levou Campos às manchetes nacionais, Feijó foi ultrapassado por Pudim e depois pelo próprio Campista, que foram para o segundo turno.

Todos sabemos que o segundo turno é na verdade uma outra eleição e em Campos não foi diferente. O que quero afirmar aqui é que o segundo turno, não foi dominado por “máquinas políticas”, uma vez que a decisão do mesmo estava nas mãos justamente daqueles que não votaram nas candidaturas das máquinas.

O que aconteceu é que o eleitorado viu no perfil de Campista a condição de representar uma forma de governo contrária a tudo o que significava o modo de governar do casal Garotinho e foi exatamente o que deu a vitória à Campista no final: a grande maioria dos eleitores de Feijó e do PT fizeram voto útil e elegeram (inclusive com menor número de abstenções e votos nulos do que no 1o turno) o candidato anti-Garotinho.
Assim Campista toma posse numa encruzilhada política: de um lado tem que atender às demandas da “máquina política” que o colocou no segundo turno e de outro, a expectativa de um governo transparente administrativamente e anti-corrupção que representava a maioria dos anseios que o levaram à vitória final.

Quero afirmar aqui que, baseados em fatos e fontes que vi e ouvi, os poucos meses do seu mandato foram muita mais na direção da segunda perspectiva, o que gerou inclusive “protestos veementes” dos comandantes de muitos descalabros administrativos que pareciam ser a marca da administração anterior.

A anulação das eleições não será por mim questionada por ser ela juridicamente perfeita (segundo os entendidos) e de natureza profundamente democrática. O problema é que a democracia política brasileira só será alcançada com uma ampla Reforma Política que ainda não aconteceu e os fatos que se seguiram iriam mostrar que a democracia ficou mesmo apenas na primeira instância e no grande ato da juíza Denise Apolinnário.

O poder municipal foi para o presidente da Câmara, como determina a lei, mas este sim era um legítimo “sangue puro” do grupo de Arnaldo, enquanto o TRE-RJ, numa série incrível de “coincidências”, dava seguidas sentenças que favoreciam o PMDB e os seus candidatos (e não só em Campos!)

As novas eleições que parecem agora se aproximar (com Campista sendo o único que não pode ser candidato!) me deixam pessimista, pois, parece que a disputa final no atual quadro vai ser mesmo entre o populismo estadual e municipal, afinal as “máquinas” estão aí, intactas.
Só me resta torcer para que no apagar das luzes, a Justiça mostre que como cega que é, assim “como os poetas” “possa ver na escuridão” e devolva o mandato à Campista, mas para que ele possa ser não “Arnaldo de novo” e muito menos Garotinho outra vez, pois quando teve oportunidade, o povo campista mostrou que isto não quer nunca mais para a nossa terra.

*Nelson Crespo é sociólogo e professor do CEFET Campos e da Escola de Serviço Social da UFF.

terça-feira, janeiro 17, 2006

Porto Real

“Mais do que o Know-How, o Brasil precisa de Know-Why”
M.R.Robert Moreau

Porto Real foi elevada à condição de cidade há dez anos, até então, pertencia ao município de Resende e era caracterizada por ser uma colônia de imigrantes italianos vindos em meados do século 19 e com profundas raízes no setor agropecuário. A maior indústria até a vinda das montadoras de automóveis era uma engarrafadora da Coca-Cola onde antes funcionava uma refinaria de açúcar, que cada vez se expande mais.
Até o “boom” automobilístico, Porto Real era uma localidade dependente de Resende e Barra Mansa. As pessoas que necessitavam aprimorar seus conhecimentos iam buscá-los em outras localidades. Hoje esta dependência ainda existe, porém, em menor escala.

Embora a fábrica da Volkswagen esteja localizada no município de Resende (outro lado do Rio Paraíba) a proximidade com Porto Real, leva a pensar que esteja localizada “no lado de cá” do rio Paraíba.
Com a chegada da Volkswagen, a reboque, vieram a Peugeot e outras empresas que integram os módulos para montagem de veículos. Uma delas é a Guardian. Com capital espanhol, veio com uma planta mundial, atraída pelos baixos custos de fabricação, mesmo com toda a cadeia de impostos. A Guardian hoje exporta cerca de 30% de sua produção.

Por serem descendentes de italianos, há um espírito de fraternidade que os une e todos se autoclassificam como parentes e ainda há coisas que só vi em cidade pequena do estado de São Paulo, como deixar as frutas caídas no dia anterior no muro para quem desejar apanhá-las, crianças brincando à noite nas ruas, pessoas conversando na calçada, céu estrelado, fazer caminhada no mato e ver pássaros silvestres, não ter barulho de buzina, ufa, e tudo isso no meio do caminho entre o Rio de Janeiro e São Paulo!
É claro que houve necessidade de atrair mão-de-obra capacitada e a cidade foi aos poucos se adaptando à expansão, com instalação de hotel, restaurantes, bancos (havia até um banco próprio, Banco Porto Real) e Resende e Penedo receberam as benesses do crescimento no setor imobiliário.

Sou por natureza um observador da alma humana, três casos me deixaram boquiabertos com a capacidade do povo brasileiro de como podem aproveitar o momento, só precisando de um empurrão (capacitação). O primeiro foi dentro da própria família, o meu cunhado (que tenho como irmão) que parecia acomodado com sua condição de motorista e com um caminhão agregado à prefeitura local, conseguiu uma oportunidade na Volks e hoje é um dos mais conceituados pilotos de testes. Vendeu seu caminhão e se dedica exclusivamente à sua atividade. Quer voltar a estudar e aprender alemão e inglês para seguir a área internacional.

O segundo caso aconteceu numa manhã quando fazia minha caminhada diária e encontro com um amigo de infância da família de minha esposa, este sem camisa e de shorts, após os cumprimentos, elogia o tempo, a natureza e a felicidade de estar num paraíso como Porto Real, pois agora estava muito feliz, pois, havia emprego para as pessoas. Pergunto se não haveria interesse de trabalhar para uma destas empresas, ele me diz que já o fez e que agora prefere a liberdade e está montando uma pequena empresa para prestar serviços para estas empresas. Este rapaz tem o primeiro grau e está se capacitando para melhorar os serviços que presta na área de construção civil. Segue a tendência mundial do setor de serviços e vai bem obrigado.

O terceiro caso foi numa oficina de mecânica de automóveis onde fiz limpeza nos bicos e a troca de velas do meu carro. O proprietário me deu uma aula de combustão e o que mais me impressionou foi o fato dele querer fazer uma avaliação de todo o sistema de injeção e assim testar o software do curso, em seu computador pessoal.

A capacitação é o fator-chave. Criatividade temos de sobra, além da vontade de trabalhar. Não necessitamos de esmolas, necessitamos de oportunidades.
Ronaldo Araújo
Engenheiro Químico

quarta-feira, janeiro 11, 2006

O bonde da história

"Quando não se sabe o caminho a seguir, qualquer caminho serve"
Ronaldo Araujo*

O Porto de Santos bateu o recorde de exportação e os produtos principais são o etanol (álcool) e açúcar (sacarose). De janeiro a outubro, foram 1.196 bilhões de litros do primeiro e 10,748 milhões de toneladas do segundo, ou seja, o agronegócio teve na indústria sucroalcooleira o título de campeão, desbancando a soja, mesmo tendo a China com um apetite voraz de quem cresce a 10% ao ano.
Nada seria possível se não tivesse como retaguarda um sistema multimodal de logística. Usinas do Oeste paulista (novo eldorado) há mais de 500 Km do Porto de Santos, utilizam o sistema hidroviário (bacia Tietê-Paraná) com transbordo em pontos estratégicos para a malha rodoviária e ferroviária.
O açúcar atingiu os mais altos níveis, seja o demerara (Bolsa de nova York) seja o branco (Bolsa de Londres). O açúcar branco será o novo filão e ainda não atingiu os níveis que podem atingir e várias usinas paulistas já estão se preparando para este novo filão, que envolverá programas rígidos de gerenciamento e qualidade, onde vigoram normas de GMP (good maufacturing practices) HACCP (harzadous analisys and critical control points), além de programas ambientais e de segurança.
Empresas na Europa e nos EUA compravam o açúcar demerara e o processavam com os padrões acima para os mercado, ou seja, agregavam valor. Agora eles estão à procura de usinas para comprar no país, pois, com a queda de subsídios houve um rebuliço geral.
O Norte Fluminense, que já capitaneou o mercado de açúcar (e álcool) no Estado do Rio de Janeiro, não aproveita este momento de crescimento no mercado nacional e mundial e nem sequer, se dá conta de sua posição geográfica privilegiada (entre os portos de Tubarão e Rio de Janeiro). Há demanda crescente, pois entrarão em operação no Brasil 51 usinas e com o crescente mercado em expansão de etanol, há estudos que indicam a necessidade de mais 80 usinas (além das 51 em construção) com moagem de 2 milhões de toneladas de cana-de-açúcar cada, para atender o mercado mundial.
É bom lembrar que alguns estados dos EUA, já adicionam etanol à gasolina para fins de redução da emissão de gases na atmosfera e olha que o governo do Bush ainda não assinou o tratado de Kyoto. O Texas, estado do petróleo (Oil State, como mostra nas placas dos carros) já instalou sua primeira bomba de etanol. O Japão torce para que tenhamos um modelo de suprimentos eficiente.
O biodiesel, que se atrela à indústria sucroalcooleira, pois se trata de um produto da reação de um ácido graxo (presente em diversas oleaginoas e sebo bovino) com o etanol (ou metanol) seria um produto de sinergia entre vários campos: agricultura, educação, economia e transportes, com a fixação da família no campo, ao invés de seu deslocamento e aumento da favelização das cidades.
Nenhum êxito será obtido se houver divórcio entre o meio acadêmico e o empresarial. Este precisa também estar atento às novas idéias e tecnologias e apoiar o acadêmico. Os exemplos da Esalq, IAC, Unesp, USP e Embrapa que em diversos setores alavancaram um sem número de programas que redundaram em produtividade, qualidade, menores custos, novas técnicas de gerenciamento e controle na indústria paulista, estão sendo copiados por outros estados como Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
O momento agora caberia uma convocação do meio acadêmico para um "Task Force" (força tarefa) para sugestão de modelos na área econômica, agricultura, tributária, química, alimentícia, saúde, saneamento básico, educação, meio ambiente o enfim tudo que redunde em sair da mesmice e aproveitar o momento de crescimento mundial.
Outros dois potenciais pouco explorados na região: a mandioca que utiliza os mesmos métodos e produtos desde os índios pode gerar um amido modificado para o mercado chinês e o meio ambiente.
*Ronaldo Araújo é engenheiro químico e atua profissionalmente desde 1979. Trabalhou em cargos gerenciais na área de produção, projetos e processos em grandes empresas do ramo farmacêutico, alimentício e química fina, tais como Bayer, Tate & Lyle, Basf e Cargill. Atuou com políticas de gerenciamento seguindo regras rígidas de qualidade, segurança e meio ambiente, comuns no mundo globalizado e competitivo intra-empresas. Trabalhou nos EUA, como “plant engineer” (“espécie de faz tudo”: manutenção, projetos, processos e produção). Se auto-intitula um “peão de trecho melhorado”. Sua última atuação profissional foi como consultor na Rússia/Ucrânia, num trabalho para hidrolizar a sacarose (açúcar de cana / beterraba) e separá-lo em glucose / frutose através de equipamento industrial de cromatografia líquida.