segunda-feira, fevereiro 20, 2006

China – Um canteiro de obras

“A economia e a administração do mundo terão que ser reavaliadas”
(José Roberto de Oliveira)

Davos se encerra com o resumo, nada surpreendente de que a China ocupa a 4ª colocação na Economia Global e com uma poupança que já ultrapassa US$ 1 trilhão. Se isto fosse uma previsão, há 15 anos seria motivo de riso, pois, até então os doutores de Harvard, Princeton e outras universidades conceituadas em economia e administração diziam que:

1 - A economia chinesa não sobreviveria com a paridade cambial fixa yuan/dólar;
2 - Que os organismos internacionais pressionariam para condições mais humanas de trabalho e menos agressivas ao meio ambiente;
3 - Que a economia chinesa estava sentada em um saco de títulos podres, que assim que resgatados haveria um colapso bancário.

Nada disso se concretizou. Houve sim uma migração de capital de empresas americanas, européias e de outros países da própria Ásia para lá.

Um almoço e uma tarde de bate-papo com um amigo, ex-colega de “república”, que hoje trabalha com validação, ramo cada dia mais crescente na Economia globalizada, e recém chegado da China, que me conta o encanto de um país que está se adequando a um novo tempo e que apesar da ditadura econômica, todos estão conscientes de que é uma nova China e diferente do capitalismo do resto do mundo.

O meu amigo foi verificar as condições de fabricação de uma empresa de equipamentos que vende com 1/3 do preço do mesmo equipamento fabricado na Suíça com idêntica qualidade. Ele também constatou que há bom relacionamento entre diretores, gerentes e operários e não ouviu de nenhum deles qualquer crítica quanto à condução da economia.

De outro lado, questionou o uso da mão-de-obra infantil e obteve como resposta a de que por lá, pelo menos, eles não ficam como pedintes nos sinais.

Há três fatores, completa ele, para o sucesso chinês: capacitação, sistema tributário simples e escala de produção. A capacitação é algo obvio, pois, nenhum país migrou para uma economia com mais distribuição de renda sem educação. O sistema tributário mais simples reduz a corrupção e a sonegação, além de haver uma fiscalização maior da população na utilização dos impostos. Com capacitação e menos tributos, diminuem os preços dos artigos consequentemente há mais mercado e havendo mais mercado, há mais escala e então mais empregos.

Cidades médias na China têm de 4 a 6 milhões de pessoas. Nos últimos cinco anos, 350 milhões de pessoas migraram do campo para as cidades (quase dois Brasis). Esta massa tem que ser alimentada e aquecida num inverno de –35ºC e ter ocupação.

O desencanto do meu amigo com o Brasil ou o encantamento com a China é tão grande que está aprendendo chinês e mandarim e até arrumou uma namorada. Com todo o ritual de apresentação da família pretende se casar. Já ia me esquecendo, a China vive todo este crescimento sem perder o respeito à sua cultura milenar.

Ronaldo Araujo

Vencerá o pior...

Luiz Felipe Muniz de Souza
Ambientalista, bacharel em direito e petroleiro.
lfmunizz@gmail.com
Campos, 14/02/2006.

Não é pessimismo, é puro realismo! Enquanto grande parte da imprensa internacional e nacional não consegue barrar os destaques jornalísticos e científicos a respeito dos estonteantes temas que tentam dar conta diuturnamente da grave crise sócio-ecossistêmica planetária – o que vem exigindo das lideranças mundiais e regionais posturas mais ousadas e vanguardistas para as urgentes mudanças do modelo de desenvolvimento –, por aqui a colonização bárbara dos senhores de engenho e os inflamados egos desvirtuantes, ainda entonam os cânticos dos postulantes ao poder, sem idéias nem perspectivas, apenas com o regozijo viciante das turbas populistas, conseguindo apenas fazer surgir lideranças com os seus aguçados olhares provincianos rumo aos cofres públicos hoje repletos de Petrodólares.

Lá fora, o ano de 2005 acaba de ser anunciado por cientistas da Nasa como o ano mais quente da história e o início de 2006 está marcado definitivamente por um inverno na Europa, na América do Norte e em parte da Ásia com as temperaturas mais baixas dos últimos tempos (até -47ºC), incluindo nevascas intensas jamais vistas, um caos de proporções gigantescas para os grandes centros urbanos e para a maioria das comunidades que vivem às margens das conquistas tecnológicas e sociais, sinais de que o clima atônito ronda a nossa casa.

Em recente entrevista a revista “Veja” o demógrafo Paul Ehrlich – da Universidade de Stanfort da Califórnia – afirma que “a falta de comida causará a morte de milhões de pessoas nas próximas décadas” e traça um prognóstico perverso quando se refere a entrada da China e da Índia na perspectiva capitalista ocidental de economia de mercado, ponderando que “a chegada de bilhões de chineses e indianos a esse mesmo nível de consumo levará a conseqüências devastadoras para o meio ambiente e para a qualidade de vida na Terra.”, ressaltando que o planeta somente teria condições de sustentar hoje a presença de 2 bilhões de habitantes com o atual padrão ocidental, enquanto já somos cerca de 6,5 bilhões de seres humanos.

Na semana passada Tony Blair, primeiro ministro inglês, escreveu na introdução de um relatório oficial sobre o aquecimento global que “é evidente que a emissão de gases, associada ao crescimento industrial e econômico da população mundial, que aumentou seis vezes nos últimos 200 anos, está aquecendo a Terra numa velocidade insustentável”.

Ao mesmo tempo a ONU anuncia em Nova York que “a desertificação ameaça 2 bilhões de pessoas no mundo”, declarando 2006 como o “Ano Internacional da Desertificação” na expectativa de unir esforços para o debate e ações proeminentes em prol da proteção da biodiversidade planetária e combate as práticas humanas que sistematicamente tem transformado áreas férteis em desertos potenciais em todos os ecossistemas, particularmente nos trópicos. Segundo o geofísico da USP, Paulo Artaxo Netto, com a velocidade da mudança climática associada a contínua ação humana predatória, é razoável imaginar que “daqui a trinta ou quarenta anos, a região central do Brasil poderá estar tão seca que talvez não seja mais possível cultivar soja em seu solo”.

Já o autor Jared Diamond, ganhador do “Prêmio Pulitzer” de literatura, biogeógrafo norte-americano e professor da Universidade da Califórnia, acaba de lançar o livro: “COLAPSO - Como as sociedades escolhem o fracasso ou o sucesso”, sendo destacado por Merval Pereira, colunista do jornal “O Globo”, em recente publicação (02/02/2006), como o livro que hoje tem orientado alguns palestrantes e profissionais da área de economia e planejamento. Diamond sustenta que “os Estados Unidos são hoje como a Roma antiga às vésperas do colapso: até capaz de perceber os sinais de alerta, mas incapaz de fazer os sacrifícios (como redução do padrão de vida) para reverter esse quadro”; traz em sua obra inumeráveis exemplos de sucesso e fracasso civilizacional e alerta que o seu trabalho é hoje em função de “nossa incapacidade de pensar no longo prazo e, principalmente, de nossa curtíssima memória”.

Dentre as tantas manifestações recentes a que mais chama atenção é a do professor James Lovelock, um dos mais respeitados cientistas ambientais da atualidade, num artigo especial de lançamento de seu último livro: “A Vingança de Gaia”, para o jornal inglês “Independent”, quando choca a todos os segmentos com um texto direto e contundente sobre o atual quadro de saúde da Terra. Ele afirma que “precisamos ter em mente a velocidade espantosa da mudança e nos dar conta do quão pouco tempo resta para agir” e que não há como mais barrar o processo da “mudança ambiental”, segundo Lovelock “cada comunidade e nação precisará usar da melhor forma os recursos que tem para sustentar a civilização o máximo que puderem.” Ainda, segundo ele: “o pior vai acontecer, e os sobreviventes terão que se adaptar a um clima infernal”.

...Mas...O que ou quem será o pior?

segunda-feira, fevereiro 06, 2006

Por um pensar e agir regional*

*Robson Santos Dias
Licenciado em Geografia
Bolsista de Iniciação Científica CNPq do NEED / CEFET-Campos

No atual estágio do sistema capitalista, o globalitarismo tem forçado as escalas locais a se adaptarem às demandas de um mercado cada vez mais competitivo e contingente. Os temas do desenvolvimento local, em uma perspectiva mais localizada e do desenvolvimento regional, numa ampliação não muito definida do desenvolvimento local, têm feito parte da maioria, para não dizer todos, os debates e encontros científicos das ciências que se preocupam com o desenvolvimento econômico e social.
Seguindo a tendência mundial, os debates, encontros e trabalhos científicos sobre a problemática da Região Norte Fluminense têm discutido de maneira bastante pertinente e profícua a questão do desenvolvimento regional. Questões sobre como diversificar a economia regional, como melhor utilizar os recursos dos royalties, a problemática urbana e, mais recentemente, sobre a vinda da refinaria dominam as rodadas científicas e as ações políticas.
Mas na minha curtíssima carreira acadêmica e científica, tenho observado uma contradição no pensar e no agir pela região. O discurso é sempre o desenvolvimento regional, mas quando fomos ver o que de fato é pensado (com algumas raras exceções) e feito em termos de política são ações fragmentárias. No campo intelectual isso pode ser facilmente resolvido, mas no campo da ação política o problema é muito mais complicado.
Existem duas ações que podemos classificar como explicitamente regionalista, visando o interesse das elites políticas e econômicas regionais, e nenhuma, pelo menos que eu tenha identificado, de desenvolvimento regional. A primeira ação regionalista foi a criação da OMPETRO para a defesa do atual regime de repasse de royalties, uma vez que este “direito” tem sido questionado por grupos políticos de outras partes do país. É de interesse comum que os municípios costeiros do Norte Fluminense e da Baixada Litorânea mantenham suas receitas privilegiadas, tendo como discurso a extração de uma riqueza que pertence a este municípios. É questionável pois nenhum município da região produz petróleo. Apenas os municípios de Macaé, Rio das Ostras, Carapebus, Quissamã e Campos dos Goytacazes, cujos territórios foram impactados pela infra-estrutura física da Petrobras, podem reivindicar alguma coisa. Fora estes, mais ninguém tem algum argumento consistente. A segunda ação regionalista é a recente coalizão pela refinaria do Norte Fluminense, sob pretexto de que este investimento alavancaria o desenvolvimento da região. Não era este o discurso na época que a Petrobras veio para a região? Se com a Petrobrás a economia regional não foi alavancada, é difícil de acreditar que a refinaria será melhor sucedida. Quanto ao regionalismo, é importante notar que as tradicionais rivalidades municipais foram deixadas de lado em benefício de um suposto desenvolvimento da região “historicamente injustiçada”.
O problema é que este regionalismo é uma forma de reificar a fragmentação da ação política. Tanto no caso da defesa dos royalties quanto na luta pela refinaria as elites políticas e econômicas municipais tentam reforçar seus privilégios políticos e econômicos em seus municípios. É de interesse destas elites a manutenção dos privilégios dos royalties, pois estes servem como instrumentos de perpetuação de seus interesses de classe. A existência de recursos abundantes, além do uso ilícito, permite o escamoteamento de sua incompetência de criar perspectivas reais de desenvolvimento econômicos e sociais utilizando-se dos recursos em “políticas de enfeite” dando a impressão de abundância e desenvolvimento. No tocante à refinaria, o debate político continua a esconder os interesses fragmentários e elitistas das classes políticas da região. A região precisa da refinaria porque há o risco de esvaziamento quando a produção petrolífera entrar em declínio. Por que tanta necessidade de uma solução exógena, se o atual período é dos mais favoráveis para o investimento na diversificação da economia? Mais uma tentativa de disfarce da incompetência das elites regionais na promoção do desenvolvimento auto-sustentado.
Na maioria das regiões mais bem sucedidas do Brasil, observa-se que a formação de enclaves isolados de desenvolvimento econômico são caso isolados e contraditórios. O desenvolvimento precisa ser territorialmente contíguo, indo além da escala local, abarcando a escala regional. Destarte, para a promoção do desenvolvimento regional do Norte Fluminense é necessário a promoção de desenvolvimento econômico e social dos municípios polarizados por Macaé e Campos dos Goytacazes. Dividir o bolo, buscando sempre ir além das pretensões regionalistas, incorporando os municípios da Baixada Litorânea que têm a vantagem de manter relações tanto com o Norte Fluminense quanto com a Região Metropolitana. O Noroeste Fluminense precisa também ser incluído e, se possível a Região Serrana. É preciso criar mecanismo menos concentradores de desenvolvimento.
Tudo isto é muito bonito, mas é utópico, um cético pode questionar. Concordo plenamente. Mas o que é a utopia senão um sonho passível de ser realizado? Creio que com vontade e ética política (que anda em falta hoje em dia) tudo é possível. Nenhuma mudança é feita com variáveis simples de resolver.