quarta-feira, março 25, 2009

Os especuladores e o trabalho no Brasil

Luiz Felipe Muniz de Souza
Advogado e Ecologista
lfmunizz@gmail.com
http://luizfelipemunizdesouza.zip.net/
Campos, 21/03/2009.

Levei anos para começar a entender as lógicas do mercado e dos especuladores mundo afora, e continuo aprendendo. Passei por caminhos complexos num sistema educacional pouco visionário, numa sociedade praticamente manipulada pelos poderes, quase absolutos, dos grandes veículos de comunicação de massa – como a grandiosa Rede Globo – e numa região castigada, historicamente, pelo coronelismo político em simbiose perfeita com uma indústria canavieira estagnada no séc. XVIII.

Não fosse a oportunidade criada, nas décadas de 70 e 80, pela Petrobras na Bacia de Campos, tanto eu como centenas de outros jovens técnicos, formados pela antiga Escola Técnica Federal de Campos – ETFC, estaríamos à mercê dos refluxos perversos do capital e do mercado. Poucas famílias da classe média tinham, naquele tempo, visão e ou condições de oferecer aos seus filhos outras oportunidades de prosseguir os estudos na capital do Estado. Assim, a expansão da Petrobras no norte-fluminense foi, desde então, a possibilidade real de redenção, no interior do Rio de Janeiro.

Em 1979 eu ingressei como técnico na antiga Companhia Brasileira de Energia Elétrica – CBEE, que depois passou a ser CERJ – Companhia de Eletricidade do Estado do Rio de Janeiro, naquela ocasião uma empresa estatal vinculada ao Estado do Rio. Saí da CERJ (1982) antes dela ser privatizada, anos depois, por um grupo chileno. Logo que assumiu, demitiu 80% da força de trabalho (anos 90), trazendo alguns profissionais do Chile para operar, em nome da “eficiência” e da “redução de custos”. Vi o mesmo acontecer com os técnicos da antiga TELERJ, uma empresa estatal de telefonia do Estado do Rio, também privatizada, que promoveu demissões em massa, terceirizando apenas alguns daqueles que já eram funcionários.

Se a turma do Fernando Henrique Cardoso tivesse emplacado mais um mandato em 2002, na Presidência da República, a Petrobras teria sido privatizada, sem sombra de dúvidas, bem como Furnas e o Banco do Brasil, dentre outras, e tudo isso com o apoio irrestrito da Rede Globo, comandada pela formadora de opinião, Miriam Leitão e cia. Penso que o Brasil estaria hoje em péssimos lençóis!

Em recente artigo publicado pelo Jornal do Brasil (06/03/09) na coluna “Coisas da Política” o sempre antenado e brilhante Mauro Santayana, comentando sobre o pronunciamento do Presidente Lula, a respeito da crise financeira mundial, no Conselho Federal de Desenvolvimento Econômico e Social (no dia anterior), afirma categoricamente:

O presidente poderia ter sido mais veemente, ao se referir ao governo anterior, mas diluiu a sua crítica dentro do contexto da globalização neoliberal. Ele poderia ter dito, por exemplo, que com todas as dificuldades brasileiras naquela quadra, o país era dos poucos que dispunham de condições para resistir aos ucasses de Washington. Mas ocorreu o contrário: cumprimos, sem reservas, as “lições de casa” cobradas pelo Consenso de Washington.”

Desde que o tremor desta crise global foi sentido em todo o planeta, a partir do último trimestre de 2008, cujo epicentro foi e é a velha famosa: Wall Street em Nova York, que os formadores de opiniões “globais” do Brasil, encabeçados pela Miriam Leitão, vêm demonstrando uma enorme frustração, uma surpresa estupenda com o “deus mercado”, agora encarnado! Eles (particularmente ela) mergulharam numa depressão juvenil, tamanho o gigantismo dos absurdos das fraudes construídas e arquitetadas pelos especuladores-mor em trilhões de dólares, logo lá(?): no ninho das águias de cabeça branca! Os “caras” sempre foram tidos como “o exemplo” a ser seguido!(?) Aquilo sim é que é sociedade livre e democrática?! O mercado é de fato quem regula o capital e o trabalho!?

As bases atuais do sistema neocapitalista ruíram de fato e de vez sim! Mesmo que, para alguns, o entendimento seja no sentido do papel cíclico e renovador do sistema. Pois eu diria, que o custo sócio-ambiental tem sido insuportável para bilhões de humanos, em particular para os pobres, os trabalhadores e para a biosfera.

O próprio verbo “especular” já inspira em si mesmo uma idéia de não-trabalho, de falsidades, de enriquecimento fácil e de espertezas antiéticas, onde somente estruturas estatais seriam competentes para o controle da ganância, sempre ilegal, presente e oculta na fachada elegante desta gente. A mesma que conseguiu a façanha de um rombo de trilhões de dólares e que vem fazendo da insanidade burguesa, da irresponsabilidade coletiva e da fraude sem limites, os objetos de desejo, mais adorados, pela maioria dos formadores de opinião em todo o mundo!

O Mauro Santayana finaliza o seu texto, de dias atrás, afirmando o seguinte sobre o governo Fernando Henrique Cardoso, o Consenso de Washington e a Crise atual:

O Estado se demitiu de seus deveres para com o povo, a fim de garantir a liberdade irrestrita do mercado. O governo privatizou o que quis, violando todas as regras do bom senso e da ética, desfazendo-se de um patrimônio construído por todas as gerações de brasileiros, a troco do desemprego, do endividamento, da miséria. Disse o presidente que a crise não pode ser pretexto para mais sacrifícios dos trabalhadores, e só com investimentos maciços e diretos do Estado será possível recuperar os empregos e, com eles, os salários perdidos nos últimos meses.”

Não fosse a obstinada e perseverante luta dos trabalhadores brasileiros em prol das conquistas legais e dos direitos sociais numa atmosfera de Estado Democrático de Direitos e Deveres, o Brasil não estaria hoje sendo visto pelo mundo como uma ilha de prosperidade e de segurança financeira. A riqueza gerada por aqui é fruto do suor de milhões de anônimos(as) brasileiros(as), que persistem e superam, noite e dia, na árdua labuta de quem privilegia o trabalho, a alegria e a fé no amanhã, em detrimento à violência e ao caos social. Mesmo tentados, permanentemente, pelas mazelas abissais da corrupção crônica e descarada, que insiste em se alastrar pelos meandros do público e do privado, e, que perpassa, há décadas, todos os Poderes da República!